O
professor Maurício Tragtenberg foi um crítico radical ao modelo dominante no
mundo. Leu, interpretou, debateu e escreveu como poucos. Deixo um breve
fragmento escrito em 1988, que infelizmente a atualidade é brutal.
“Uma coisa que eu sempre perguntei: por que a
defasagem brutal entre o professor de primeiro e de terceiro grau? É uma
imoralidade social brutal o professor de terceiro grau ganhar 200 a 300% mais
do que o professor de primeiro grau. Isso acaba com qualquer sistema escolar. É
menor a responsabilidade social de uma professora que fica cinco horas com uma
criança do que a do professor que fica comum barbudo de pós-graduação com
aquela angústia da tese? Você, então, é qualificado de acordo com a classe social
a que serve. E qual é a maior glória do professor? Deixar de ser professor.
Isso é o fim! Uma carreira de professor cuja maior glória é deixar de ser
professor! Depois dizem que administração é racional. Se uma organização
estrutura a carreira cujo ápice está na condição de você abandonar a sala de
aula, e quanto mais abandona maior é a prova de que você tem status...
É terrível! Quando o profissional
ganha salário baixo, o que acontece? A profissão é feminilizada; mixaria é para
mulher. E aí se confunde mãe com professora e o aluno chama a professora de
tia. É uma loucura total, uma confusão de papéis sociais tremendo. E nem se se
fala da professora que cuida das crianças de 0 a 6 anos. Eu, por exemplo,
conheço muitas cidadãs que não são professoras, são pajens. E é tão “atraente”
o salário que uma cidadão voltou a ser faxineira, porque ganha mais fazendo
faxina em casas do que trabalhando com crianças de 0 a 6 anos. E depois vêm me
falar da pré-escola! É uma brincadeira!
Você está numa sociedade capitalista em que tem que pagar tudo. Você não é professor mercenário e até para respirar você paga. Numa economia capitalista, o salário é o elemento central. E num país onde o salário é de escravo, é muito difícil você falar em pedagogia, falar de técnicas de educação, falar de função formativa do professor, do professor como detentor do saber. Não se iludam, não há tanto saber assim para deter. E isso até o terceiro grau.
(...)
Eu percebi uma coisa: que os níveis de remuneração tão diferentes entre os graus têm relação com a classe social, com a clientela a quem se serve. Quanto mais você serve a população mais carente, menos o teu salário tem peso e menos você tem status. Tem muita gente que se envergonha de dizer que é professor de primeiro grau porque ele foi inteiramente desvalorizado durante os últimos anos. E isso não foi somente no período da ditadura. Muito antes já era desvalorizado. E aí se estruturou a carreira cuja glória é deixar de ser professor."
(...)
Eu percebi uma coisa: que os níveis de remuneração tão diferentes entre os graus têm relação com a classe social, com a clientela a quem se serve. Quanto mais você serve a população mais carente, menos o teu salário tem peso e menos você tem status. Tem muita gente que se envergonha de dizer que é professor de primeiro grau porque ele foi inteiramente desvalorizado durante os últimos anos. E isso não foi somente no período da ditadura. Muito antes já era desvalorizado. E aí se estruturou a carreira cuja glória é deixar de ser professor."
O artigo completo está
no livro Educação e burocracia, de Maurício Tragtenberg, Editora UNESP.
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