Lendo a dissertação de mestrado A
CIDADE DA ORDEM : TENSÕES SOCIAIS E CONTROLE ( JOINVILLE 1917/1943), de Iara
Andrade Costa, encontrei um fragmento emblemático para semana que antecede o
carnaval na cidade do prefeito/patrão Udo. É curiosa a permanência em certos aspectos dos anos de 1920 em pleno 2016.
Enquanto se elogiavam as
festas (nota: da colheita e religiosas), que eram raras, mas vividas
intensamente ao lado do trabalho e da disciplina, criticava-se, por outro lado,
os hábitos do "footing" aos domingos, onde as moças desfilavam
"durante a tarde inteira" ao redor das praças centrais, com toalete a
rigor e onde não se costumava repetir os trajes .
Para um articulista da
época, isto demonstrava a frivolidade das moças e só lhes trazia prejuízo e
desdém pois, segundo ele.
... afugentam de si qualquer
inclinação séria, que por ventura tenham inspirado para um fim nobre, porque
não há rapaz algum, sério e bem intencionado, que não receie unir o seu destino
ao de uma jovem, que gosta de exibir-se a ponto de passar horas inteiras,
perambulando pelas ruas, numa vadiação inconseqüente, quando podia empregar
muito mais a propósito, tempo tão precioso, no preparo e no arranjo do seu lar,
do conforto dos seus, aprofundando a sua instrução, ajudando nesses mil
pequenos nada, em que uma moça ou uma senhora sempre pode se ocupar, seja qual for
a fortuna que Deus a brindou. ...
O importante, e o que se
valorizava era o trabalho produtivo. O lazer das cidades brasileiras, como o
"footing", o carnaval, onde se "brinca " quatro dias e
depois disso a cabeça do trabalhador "anda a roda", era vista como
sintoma da desordem. Valorizava-se os bailes públicos por serem mais
controlados, tanto na ordem como na harmonia e animação. O corso foi sempre uma
tentativa de tornar o carnaval da região mais popular, mas na imprensa sempre apareceu com uma nota
de repúdio pelo seu "caráter" de bagunça, desorganização e provocador
de acidentes por conta da imprudência dos "foliões ".
A elitização do carnaval de
salão, aqui sempre foi uma constante, assim como a queixa de falta de lazeres
públicos, principalmente nos finais de semanas chuvosos, quando a tristeza, a
"falta do que fazer" imperava na cidade. Em 1928, noticiava-se a
ausência de carnaval nas ruas. "Este ano pelo que parece não haverá
carnaval de rua com cordões carnavalescos, blocos, ranchos para quebrar as "monotonias
" das ruas, pois faltam só dois dias e nada se fala, a não ser nos
carnavais de salões que pelo que tudo indica, já é alguma coisa ". II
Os domingos, refletiam a
tristeza, onde a "falta do trabalho" rotineiro, levaria a vadiagem,
reforçando a idéia de trabalho produtivo, somente o comercial ou industrial.
Mas o que parecia mais triste era o retrocesso do lazer, conforme avançava o
processo de industrialização e o crescimento da cidade.
Domingo morreu, na tristeza
de uma trovoada. (...) Sente-se que nos domingos, todo o encanto da nossa
mocidade e toda a alegria do nosso povo expansivo se perde na vastidão das ruas
desorientado. Falta-nos um parque, um centro de diversão onde Joinville toda
pudesse concentrar-se e viver, numa tarde de domingo as alegrias e as emoções
de uma reunião festiva. Antes, Joinville oferecia às tardes, centros de
reuniões magníficos, nos seus parques, nos seus jardins, onde ß'eqüentemente orquestras
e bandas musicais, punham notas vivas e atraentes de uma arte bem cuidada.
Hoje (...) vir-se-ia que
Joinville retrograda. E se não fora a evidência das nossas forças econômicas,
manifestadas no comércio e nas indústrias florescentes, crê-lo-íamos fracamente.
III
O discurso da cidade
maravilhosa, ordeira e laboriosa, trazia ao mesmo tempo, uma preocupação enorme
com a outra Joinville, que diretamente proporcional ao seu encantamento e
desenvolvimento, descobria-se que além da falta de lazer, tinha-se problemas muito
sérios a serem contornados como a mendicância, higiene e saúde, policiamento, habitação,
água, instrução, transportes, jogos, etc.
Notas
I – JOÃO DA MATTA Bancando o
Chie. Jornal de Joinville. Joinville, 14 de Janeiro de 1924 N. 12 Ano
II - Está chegando a hora !. Jornal
de Joinville. Joinville, 16 de Fevereiro de 1928, N. 40, Ano X, p.l
III - Locais. Jornal de Joinville. Joinville,
21 de Janeiro de 1919, N.09 , Ano I p.2